Belo Monte: cancelada novamente licença e leilão de hidrelétrica
Segunda ação civil pública do MPF foi julgada nesta segunda-feira, 19 de abril
A Justiça Federal de Altamira (PA) ordenou novamente a suspensão da licença ambiental e do leilão da hidrelétrica de Belo Monte, que estava marcado nesta terça-feira, 20 de abril. A liminar foi concedida pelo juiz Antonio Carlos de Almeida Campelo em ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal no Pará.
Na decisão o juiz considerou exaustivamente delineadas as razões para considerar irregular a licença prévia concedida pelo Ibama. Ele arbitrou multa de R$ 1 milhão ao Ibama e à Aneel em caso de descumprimento da ordem e suspendeu os efeitos da Declaração de Reserva de Disponibilidade Hídrica, espécie de concessão da água do Xingu para o aproveitamento hidrelétrico, emitida pela Agência Nacional de Águas.
O MPF havia demonstrado ao juiz várias irregularidades presentes no licenciamento, causadas pela pressa em fazer o leilão ainda em 2010: análises apresentadas pela população em audiências públicas foram desconsideradas, não há dados científicos conclusivos sobre a manutenção da vida no trecho do Xingu que será desviado, nem sobre a qualidade da água, nem sobre os programas de mitigação dos impactos.
O juiz considerou violação do princípio da participação o fato de todas as contribuições da sociedade terem sido expressamente ignoradas pelo Ibama. Ele cita ainda a contradição evidente entre dois pareceres técnicos do Ibama feitos no mesmo dia (29 de janeiro último), com conclusões diametralmente opostas: um apontava lacunas que impediam atestar a viabilidade ambiental do empreendimento e outro liberava a licença.
A equipe mantém o entendimento de que não há elementos suficientes para atestar a viabilidade ambiental do empreendimento, diziam os técnicos na Nota Técnica nº 4/2010. No mesmo dia, o Parecer Técnico Conclusivo nº 001/2010 concedeu a licença para o empreendimento transformando todos os dados que estavam ausentes em condicionantes.
Como, no mesmo dia, dois documentos são emitidos, pelo Ibama, com informação totalmente contraditória em um empreendimento de grande vulto e complexidade como o AHE Belo Monte?, pergunta o juiz na liminar.
Uma das informações ausentes era sobre a qualidade da água. Os técnicos do Ibama alertaram que era preciso aguardar um parecer de especialistas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, encomendado especificamente para o licenciamento de Belo Monte. Mas em 1º de fevereiro, a licença foi expedida com a condicionante de que fosse feito novo estudo para prognosticar a qualidade da água.
Extrapola o limite do bom senso e de qualquer argumentação jurídica recomendar, como condicionante, ao final de um Estudo de Impacto Ambiental, a realização de outro estudo específico e de alta relevância para os povos indígenas, para as populações ribeirinhas e para a fauna aquática do rio Xingu, registra a liminar judicial.
Para o MPF, a sobrevivência de pessoas, da fauna e da floresta em um longo trecho de rio estará ameaçada se a hidrelétrica for feita sem os dados científicos completos. O juiz partilha essa preocupação. Caso fosse analisada pela corte suprema norte-americana, a hidrelétrica de Belo Monte certamente seria impedida de ser construída, disse o juiz, ao examinar a falta de dados sobre a rica ictiofauna do rio Xingu, onde vicejam espécies de peixes ornamentais de grande valor comercial no exterior. Ele citou um caso em que os magistrados americanos impediram a construção de uma usina porque iria extinguir certa espécie de molusco.
A dúvida acerca da manutenção do ecossistema do rio Xingu significa um entrave primordial no Eia do AHE Belo Monte, que merece um aprofundamento de estudos específicos, com mais vagar e consistência, sob pena de haver irreparável dano ambiental não somente à comunidade atingida, mas talvez à toda humanidade pelo possível desaparecimento de espécies de peixes cujas características sequer foram estudadas, registrou ao comentar a inconsistência do hidrograma proposto pelo Ibama para ser testado no rio.
Além das questões ambientais e de direito, o juiz também considerou suficientes os indícios de irregularidades formais no processo de licenciamento. Para marcar o leilão da hidrelétrica, a Aneel deveria ter obtido licença de instalação e não apenas a prévia, como foi feito. E a concessão feita pela Agência Nacional de Águas deveria ter sido modificada quando o Ibama modificou o hidrograma previsto para o trecho do rio que será desviado pela hidrelétrica.
FONTE: Procuradoria da República do Pará
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